EM MAIO

EM MAIO

Já não há mais razão de chamar as lembranças
e mostra-las ao povo
em maio.
Em maio sopram ventos desatados
por mãos de mando, turvam o sentido
do que sonhamos.
Em maio uma tal senhora liberdade se alvoroça,
e desce às praças das bocas entreabertas
e começa:
“Outrora, nas senzalas, os senhores...”
Mas a liberdade que desce à praça
nos meados de maio
pedindo rumores,
é uma senhora esquálida, seca, desvalida
e nada sabe de nossa vida.
A liberdade que sei é uma menina sem jeito,
vem montada no ombro dos moleques
e se esconde
no peito, em fogo, dos que jamais irão
à praça.
Na praça estão os fracos, os velhos, os decadentes
e seu grito: “Ó bendita Liberdade!”
E ela sorri e se orgulha, de verdade,
do muito que tem feito!
Oswaldo de Camargo. Em maio. Cadernos Negros: os melhores poemas. São Paulo, Quilombhoje, 1998. Página 112.
 

Comentário Mércia Sacramento: Quando se cita no texto “meados de maio”, provavelmente se faz referência à Abolição da escravatura, que ocorreu em 13 de maio de 1888. O eu-lírico do texto expressa que existiriam mais de um tipo de liberdade, em que uma seria algo que não vem do coração, e a outra seria uma que se sente dentro do peito, “queimando”. Esta primeira estaria em evidência nas praças, principalmente, por quem grita sua liberdade quando se assinou a Lei Áurea. O eu lírico, entretanto, indiretamente demonstra que a verdadeira liberdade ainda não é simplesmente clamar sua liberdade, já que isso seria conservador; e mostra a existência de uma outra liberdade idealizada.

QUESTÃO UFBA

1- No poema, a voz poética:

(01) contesta  significado atribuído a um relevante fato histórico do discurso oficial.

(02) evidencia uma consciência crítica que se rebela em decorrência de uma condição social imposta e consagrada pelos discursos constituídos.

(04) canta uma outra liberdade, sonhada e construída pelo cidadão negro.

(08) rejeita o ritual da praça por considerá-lo arbitrário e indicador de uma ideologia conservadora e autoritária.

(16) desloca-se para um contexto do qual ele será considerado como excluído.

(32) nega que senhores e escravos, no mundo de outrora, davam relevância à liberdade conquistada na praça.

(64) critica a coisificação consentida do ser negro, ou seja, a sua alienação.

UFBA/ 2011, Primeira Fase, Português, questão 09.

Gabarito: Proposições verdadeiras: 01, 02, 04, 08 e 64.

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